SÃO JOSÉ É O MAIOR
(Pe. Manuel de Alencar, 1886-1924)
"Um dia à porta do céu
Foi bater com muita fé
Um esfarrapado devoto
Do nosso Pai São José
Logo abre-lhe a porta São Pedro
E vai gritando ¬ Quem é?
¬ Sou eu São Pedro, um devoto
Do nosso Pai São José!...
Donde é que bem Voss’mecê,
Cheirando tanto a café? ..
¬ São Pedro sou brasileiro,....
E venho lá de Tefé! .
Se de lá vem, diz São Pedro,
Quem sabe não é pajé?!
¬ Saberá fazer feitiço
Com dente de Jacaré?!
¬ Deus me livre. Grande Santo
Que nada fiz contra a Fé!...
Santo não; mas fui devoto
Do nosso Pai São José. .
¬Passe pra cá meu livrinho,
A sua conta corrente...
Vamos ver se lá por baixo
Você viveu cristãmente...
Oh! Trabalhar nos domingos
Isso é pecado mortal, .
Pois é a lei que nos domingos
Descanse até animal. .
Ah! Foi no tempo São Pedro
Em que eu era seringueiro...
Foi no tempo em que a borracha
Ainda dava dinheiro.
¬ Aqui também está marcado
Que raramente ia à Missa...
Então por que?... Por desprezo,
Por descuido, ou por preguiça?...
¬ Confessou-se uma só vez:
¬ No dia do casamento!...
Só recebeu nesse dia
O Santíssimo Sacramento
¬ E por desgraça suprema,
Que me causa compaixão,
Não teve Padre na morte,
E morreu sem confissão...
¬ Meu amigo, eu lhe aconselho:
Não se apresente ao Eterno!...
No Céu não acha lugar:
¬ Foi condenado ao Inferno...
Esmagado pelo dor,
O triste mísero réu
Ao lado do seu saquinho
Sentou-se à porta do Céu.
Nisto, um anjinho bem loiro
Com linda estrela na testa,
Veio olhar pela janela,
Mostrando uns ares de festa.
Meu bem, ¬ (lhe diz o devoto),
¬ Vá dizer a São José
Que foi logo ao Pai Eterno
E perguntou: ¬ Como é?!...
¬ Chegou-me agora aos ouvidos,
Ó Divino Pai Eterno,
Que um pobre devoto meu
Foi condenado ao Inferno.
¬ Não me queixo da Justiça
Nem da vossa Divindade,
Mas agora em parte alguma
Terei mais autoridade!...
¬ Devo pois me retirar,
Ao mundo, se for preciso,
Mas sem prestígio nem força
Não fico no Paraíso!...
E deixando o Pai Eterno
Surpreso dessa atitude.
São José foi se afastando,
Meio triste, meio rude...
¬ Maria, Esposa querida,
Arrume a nossa bagagem,
E vá também se arrumar,
Que vamos fazer viagem...
Aqui, o Santo Menino,
Vendo tanta arrumação,
Foi perguntando ¬ Mãezinha,
Para onde é que vocês vão?...
Sempre humilde e obediente,
Calou-se a Virgem Maria,
E dando a Jesus um beijo
Respondeu que não sabia...
¬ Meu Filho ¬ (disse chorando
O nosso Pai São José)
Tornamos de novo ao mundo,
Voltamos a Nazaré...
¬ Pois então, ¬ disse o Menino,
¬ O Mandamento pratico:
Obedecendo a meus Pais,
No Paraíso não fico!...
Vendo os Apóstolos que o Mestre
Lá ia embora também
Disse João Evangelista:
¬ No Céu não fica ninguém!...
E os anjos logo disseram:
¬ Que querem, pois, que se faça?
¬ Sem Jesus e sem Maria
Já fica o Céu tão sem graça!...
Todos aí, se mexeram,
E cada qual, decidido
Foi arrumar a bagagem
No jubiloso alarido...
Houve um grande rebuliço
Entre os Anjos e entre os Santos
Profetas e Confessores
Anacoretas e quantos.
Na terra haviam seguido
Com sacrifícios e amor,
Os passos de Jesus Cristo,
A Lei Santa do Senhor...
São Pedro, à porta do Céu,
Espantado e obediente,
Olhava pro Pai Eterno,
E olhava praquela gente...
Sossegadinho, o devoto,
Diminuindo a agonia,
Sentado junto do saco,
Olhava tudo e sorria...
Fala, então, o Pai Eterno:
¬ Isto assim não pode ser:
¬ Sozinho no Paraíso
É que eu não posso viver!...
E disso logo a São Pedro:
¬ Venha esse homem para aqui:
¬ Vou reformar a sentença
Que contra ele escrevi!...
¬ É, de fato, escandaloso,
Nunca se ouviu “ab aeterno”
Que amigo de São José
Caísse um dia no Inferno...
¬ Perdôo, ¬ disse ao devoto,¬
Por minha grande clemência:
¬ Volte à terra mais um ano,
E faça lá penitência...
¬ Volte, depois, preparado
Pro rigoroso Juízo
E não venha cá meter
Desordem no Paraíso!...
São José sorriu contente,
Maria sorriu também,
E Jesus falou bem alto:
¬ Digamos todos: Amém!...
O Céu vibrou de alegria,
Anjos cantaram melhor...
E o devoto bateu palmas:
¬ SÃO JOSÉ É O AMOR!...
Isto vem mostrar à gente
O poder de São José:
¬ Quem queira mesmo salvar-se
Tenha nele muita fé!..."